segunda-feira, 10 de maio de 2010

PROJETO REDUZ IDADE PARA CRIANÇA FREQUENTAR ESCOLA

Proposta, já aprovada no Senado, divide opiniões ao diminuir de seis para cinco anos a entrada de alunos no ensino fundamental
Isabel Vilela -CORREIO BRASILIENSE
Publicação: 10/05/2010 09:00

A Câmara dos Deputados discutirá em audiência pública nesta quarta-feira o Projeto de Lei nº 414/2008, que propõe a antecipação do acesso de alunos ao ensino fundamental. A proposta, de autoria do senador Flávio Arns (PSDB-PR), altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), diminuindo de seis para cinco anos a idade de entrada das crianças no primeiro ano fundamental. Aprovado no Senado, o texto agora tramita na Câmara, e se tiver voto favorável na Comissão de Educação e Cultura, segue para sanção presidencial.

Mas o projeto é polêmico. Para vários setores da sociedade ainda há muito o que se discutir. A Rede (1)Nacional Primeira Infância, por exemplo, não aceita a proposta e vai apresentar um manifesto durante a audiência pública realizada pela comissão da Câmara. “A rede é contra a antecipação do ensino fundamental para os cinco anos de idade porque é um direito da criança a educação infantil até o término do 5º ano. Ele começa, por lei, aos seis anos. Se você antecipa, a criança vai entrar muito nova e perder a experiência pedagógica adequada a essa fase do desenvolvimento”, defende Vital Didonet, membro da Organização Mundial para Educação Pré-Escolar (Omep) e coordenador da secretaria executiva da Rede Nacional Primeira Infância.

No meio acadêmico, muitos pesquisadores partilham da ideia de que as crianças não estão preparadas para ingressar no ensino fundamental aos cinco anos. A Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) publicou carta de repúdio ao projeto de lei e o grupo de estudos e pesquisas em educação infantil da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB) também se manifestará da mesma forma na audiência pública. O autor do projeto, Flávio Arns, defende que a alteração é necessária para colocar a LDB em conformidade com a Constituição, depois da Emenda nº 53, de 2006, que tornou obrigatória a educação infantil. “A Constituição diz de maneira bastante clara que a educação infantil vai até cinco anos”, defende Arns.

Polêmica

Para o senador, a proposta é benéfica aos novos estudantes. “O que a lei fez foi apenas tornar a pré-escola obrigatória. Isso significa que a criança, ao entrar no conteúdo propriamente dito de alfabetização, já vai ter tido um ano de educação escolar, se acostumando com a escola, os professores, os diálogos, o material escolar, o que fará com que ela tenha mais chances de sucesso quando estiver na segunda série”, justifica Arns. O presidente da Federação Nacional de Escolas Privadas, José Augusto de Mattos Lourenço, afirma que a questão também é constitucional. “No fundamental de nove anos a única mudança que houve foi de nomenclatura. O aluno estava na 8ª e foi para o 9º ano, mudou só a etiqueta do livro. O que se chamava pré-escola passou a se chamar fundamental do 1º ano”, explica.


Porém, o Ministério da Educação diz que o argumento é baseado em uma interpretação não adequada da emenda. “Nossa visão é de que uma criança com cinco anos é uma criança de cinco anos, 11 meses e 30 dias”, diz o diretor de Concepções e Orientações Curriculares para a Educação Básica do MEC, Carlos Artexes Simões. O ministério determina que sejam matriculadas no ensino fundamental crianças que completem seis anos até 31 de março do ano letivo. A União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) também defende a instituição da data de corte na legislação brasileira. “A ampliação do ensino fundamental para nove anos se deu para que a gente pudesse reestruturar e ter um tempo maior para alfabetizar melhor as crianças”, justifica o presidente da entidade, Carlos Eduardo Sanches.

1 - Encontro

A Rede Nacional Primeira Infância é formada por 74 organizações da sociedade civil, do governo, do setor privado, de outras redes e entidades multilaterais. O grupo, com outras instituições, irá promover amanhã, na Assembleia Legislativa do estado de São Paulo, um ato público para discutir o projeto de Flávio Arns. Além disso, durante o encontro, a Rede vai analisar as consequências da aprovação da proposta e será distribuída aos deputados paulistas uma carta contra a inclusão de crianças de cinco anos no ensino fundamental.


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Estados já adotam sistema

O Ministério da Educação, por meio do Conselho Nacional de Educação (CNE), definiu que sejam matriculadas no ensino fundamental crianças que completem seis anos até 31 de março. Apesar da resolução publicada pelo CNE em janeiro de 2010, vários sistemas de ensino têm crianças com cinco anos cursando o ensino fundamental. A própria resolução previa que, excepcionalmente este ano, menores com esta faixa etária — independentemente do mês do seu aniversário, que já tivessem frequentado por mais de dois anos a educação infantil — poderiam seguir os estudos.

No Paraná, uma lei estadual garante a matrícula no primeiro ano de menores de cinco anos. Em Mato Grosso, mandados judiciais permitem a mesma situação, enquanto que em São Paulo, a questão varia entre os municípios.

No Distrito Federal, a Secretaria de Educação considerou para as matrículas de 2010 a data de corte que utilizava antes da resolução, de 31 de junho passado, mas afirma que, a partir do ano que vem, levará em consideração a data estabelecida pelo CNE. “O objetivo da pré-escola é propiciar situações de cuidado, socialização, autoconhecimento, respeito, confiança, tudo isso de uma forma mais específica que no ensino fundamental”, diz Helane Lima, vice-diretora da Escola Classe 305 Sul, que este ano recebeu alunos com cinco anos. “O importante é que o Estado lute para que a criança entre o mais cedo possível na escola, sim, mas respeitando as fases do desenvolvimento”, ressalta Helane.

A pesquisadora em educação infantil Fátima Guerra concorda com a vice-diretora. “Uma criança pequena não pode ficar muitas horas sentada fazendo tarefa. No ensino fundamental, vai se aplicar a cobrança da sociedade de saber ler, escrever, uma série de coisas que não são próprias para as características e necessidades das crianças de cinco anos”, afirma Fátima. (IV)

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